Supremo evita nova interpretação da Carta, que permitiria candidaturas dos atuais presidentes da Câmara e do Senado. Votação foi de 7×4 contra tentativa de reeleger Maia e 6×5 contra Alcolumbre
Após um julgamento que teve início na manhã da sexta-feira (4) e se prolongou durante todo o final de semana, o Supremo Tribunal Federal (STF) formou maioria para vetar a possibilidade de autorizar candidaturas de Rodrigo Maia (DEM-RJ) e de Davi Alcolumbre (DEM-AL) à reeleição para o comando da Câmara dos Deputados e do Senado, respectivamente. Os votos decisivos de três ministros ―Luís Roberto Barroso, Edson Fachin e do presidente do Supremo, Luiz Fux, todos contrários à tese da reeleição―foram dados na noite deste domingo (6). O julgamento ocorreu no plenário virtual da Corte, em que os ministros votam de forma remota, sem debate entre eles no pleno do Tribunal.
Dessa forma, com o anúncio do votos de todos os 11 ministros do STF, o placar final aponta para sete votos contra e quatro a favor da possibilidade da reeleição de Rodrigo Maia e seis votos contrários e cinco a favor de uma eventual candidatura de Davi Alcolumbre. A diferença se dá por conta do voto do ministro Kassio Nunes Marques, que entendeu que apenas Alcolumbre deveria ter o direito à reeleição.
Os ministros Marco Aurelio Mello, Cármen Lúcia e Rosa Weber também votaram contra a reeleição. Já os votos vencidos, a favor de ambos concorrerem a um novo mandato, vieram dos ministros Gilmar Mendes, o relator do caso, Antonio Dias Toffoli, Ricardo Lewandowski e Alexandre de Moraes.
Como os magistrados que já votaram ainda podem teoricamente alterar o seu parecer, o resultado final só pode ser proclamado após o término oficial do julgamento, que tem prazo para acontecer até o dia 11 de dezembro. No entanto, são raros os casos de mudança de decisão após o anúncio dos votos.
Nova interpretação
Com o resultado, chega ao fim a tentativa de reinterpretar um trecho da Constituição que diz que é “vedada a recondução para o mesmo cargo, na eleição imediatamente subsequente” para o comando do Congresso, ou seja, a reeleição não pode ocorrer no mesmo mandato. Segundo Thiago Bottino , professor da Fundação Getúlio Vargas (FGV) Direito Rio e pós-doutor pela Columbia Law School, o texto da Constituição Federal é explícito ao proibir os chefes da Câmara e do Senado de tentarem uma reeleição na mesma legislatura, que tem a duração de quatro anos. Antes do anúncio do resultado, ele havia afirmado que “a lei expressa pela Constituição é clara. Se o Supremo decidir por permitir a reeleição, será uma interpretação política, e não jurídica”.
Na visão de Bottino, se a decisão tivesse sido pela reeleição, não seria a primeira vez que o STF substituiria por vontade própria algo expresso em um artigo constitucional. Ele cita como exemplo a interpretação sobre a prisão em segunda instância, colocada apesar de a Carta determinar a inocência até o trânsito em julgado do processo, ou seja, a terceira instância. “Decidindo por permitir a reeleição, o STF estará substituindo a vontade dos parlamentares que redigiram a Constituição pela sua própria. Esses parlamentares foram eleitos para isso, enquanto os juízes do Supremo não tiveram nenhum voto”, relembra Bottino. O cientista político e também professor da Fundação Getúlio Vargas (FGV) Claudio Couto, vai na mesma linha: “a norma constitucional é um texto absolutamente cristalino e criado para evitar personalismos”.
A ação julgada pelo STF foi movida pelo PTB de Roberto Jefferson, aliado ao presidente Jair Bolsonaro, com a intenção de barrar uma eventual tentativa dos comandantes atuais das Casas legislativas de concorrer na próxima eleição do Congresso, marcada para o início de fevereiro de 2021. Com o fim da possibilidade de reeleição de Maia, o candidato do Planalto à Presidência da Câmara deve ser Arthur Lira (PP-AL), líder do Centrão, deputado federal que é réu sob acusação de corrupção passiva. Já no caso do Senado, agora deverá ter início o xadrez político pra definir quais serão os principais postulantes ao cargo.
Bolsonaro ainda não se manifestou sobre o julgamento do STF, mas o vice-presidente, Hamilton Mourão, disse na sexta-feira que era contra a alteração da regra colocada na Constituição. “Acho que a Constituição Federal é clara. Não pode. Eu acho que teria que mudar a Constituição, mas o Supremo tem, vamos dizer, tem o arbítrio para interpretar da forma que melhor lhe aprouver”, afirmou.
Ao longo de seu voto, que foi acompanhado por três colegas, Gilmar Mendes fez uma longa defesa “necessidade de se proceder a certa adaptação constitucional, em face de determinada disfuncionalidade concreta”. De quebra, lamentou a dificuldade que é aprovar uma emenda no Legislativo que mude a Carta: “A aprovação de emenda à Constituição não é algo que se possa realizar facilmente, tanto o mais quando trata de matéria propícia a gerar impasses político-institucionais”. No sábado, Rosa Weber foi dura ao rebater: “A deslealdade ao texto constitucional caracteriza preocupante ofensa ao pacto da sociedade brasileira em torno do propósito de conferir força ativa aos compromissos assumidos no plano constitucional”.
Fonte: Brasil.elpais