Eleição e governo são realidades diferentes e que exigem diferentes estratégias e mudanças de comportamento.
Na verdade, este princípio contém dentro dele a seguinte advertência: “O que ajudou na eleição tende a prejudicar no governo”. A questão da passagem de “modo”, portanto, é bem mais séria e urgente do que poderia parecer a uma consideração superficial. Eleição e governo são realidades diferentes (é óbvio) e que exigem diferentes estratégias e mudanças de comportamento (nem tão óbvio). Vamos enunciar 10 questões que balizam esta mudança e que devem se constituir na preocupação imediata do governante ou legislador eleito.
Após a eleição, o político eleito passa de atacante a alvo
1) A parte e o todo
A campanha eleitoral é sempre dirigida a uma parcela do eleitorado, quantitativamente expressiva, a ponto de poder eleger o candidato, mas sempre uma parte. A candidatura é uma entre outras, o partido é intrinsecamente uma parte da opinião política organizada e a estratégia de campanha foca seus esforços numa parte do eleitorado, desprezando os eleitores fixos de outros candidatos.
Ao ser eleito o governante é governante de todos. Agora representa o todo, não mais a parte. Seu governo, seus auxiliares, seu discurso, seus comportamentos, devem exteriorizar esta nova condição em que se encontra: a de governar/legislar para todos. Não é fácil esta parte da metamorfose. Abrir-se para os “outros” significa deixar o terreno conhecido e confiável da sua “parte” para ingressar no território do “inimigo”. Seus companheiros da sua “parte” lutaram e ganharam. Agora, querem mandar, governar. Poderão ter pouca compreensão para as concessões, transigências e acordos que você vai precisar fazer para governar. A linguagem de combate deve ceder espaço à linguagem da união e da conciliação. Finalmente, esta é uma parte da metamorfose que não pode tardar. Começa tão logo você é eleito, nos seus primeiros pronunciamentos.
2) Propor e criticar x realizar: agora você é vitrine
Eleito você torna-se vitrine. Adquire as vantagens da condição junto com os riscos de tornar-se alvo dos “estilingues de plantão”. Durante a campanha, você propôs, talvez mesmo, tenha avançado além do que a prudência recomendaria para se eleger. Durante a campanha você atacou o governo em exercício e mostrou suas falhas, seus erros, sem nunca se preocupar em analisar mais detidamente se não havia razões fortes o bastante para explicá-los, desculpá-los, ou, pelo menos, para reconhecer atenuantes. Não. Você foi terrível. Apontou os erros, identificou responsáveis, mostrou as terríveis conseqüências, imputou irresponsabilidades e incompetências. Agora, os problemas são seus. São de sua responsabilidade pessoal. E você logo vai descobrir que eles são mais complexos e difíceis de resolver do que pareciam quando você era “estilingue”. Mais ainda, agora você deve enfrentá-los e resolvê-los, e o povo que o elegeu vai esperar, de quem foi tão enfático na crítica, uma superior capacidade para dar conta deles. Você será cobrado pela mídia, pela opinião pública, e, sobretudo, por seus adversários. Passar de “modo” neste item é tensionar toda a sua administração para realizar o prometido. É lutar, dia após dia, contra as dificuldades financeiras, burocráticas e políticas, para realizar, fazer acontecer. A lua de mel, com a suspensão temporária das cobranças e críticas, vai durar pouco.
Ao ser eleito, os problemas são responsabilidade pessoal do político. Ele deixa de ser “estilingue”
3) Plano de governo: uma arma que era a favor agora é contra
Na campanha o plano de governo era uma arma. Ele compendiava a sua capacidade, a qualidade de seu staff técnico, a sua originalidade e criatividade, o rumo certo para as mudanças seguras. O plano subsidiava seus programas de TV e seus discursos. Era estrela nos debates. O plano era o futuro no papel. Estava tudo lá: o diagnóstico e a terapia, o que fazer e como fazer, o cronograma, o organograma, o novo estilo…
Agora, o plano é uma “camisa de força”. Tornou-se o material de referência para as cobranças. Nas suas reuniões com os funcionários permanentes, com seus homens de orçamento, você logo vai ter más notícias, referentes ao seu plano. Eles logo vão alertá-lo sobre a tênue relação que o plano possui com a realidade administrativa e financeira que lhe cabe dirigir. Para não ter que ficar dando explicações pelo resto do mandato você deve imediatamente transformar aquele plano de campanha num programa de governo. Vai ter que recondicioná-lo, adaptá-lo à realidade e vender à opinião pública seu programa de governo, viável, realizável e atraente.
A passagem de “modo” neste aspecto implica em elaborar este programa de governo, contemplando suas principais promessas e compromissos, transformadas em prioridades de governo. Vendê-las com um marketing agressivo e persuasivo, deixando de lado questões de menor importância que, embora estivessem no plano de campanha, não vão integrar o programa de governo, ou questões de importância, mas com relação às quais você não fez promessas e nem assumiu compromissos explícitos.
Fonte: Política para Políticos