Marqueteiro de Lula, João Santana dá dicas de campanha

joao_santanaO jornalista baiano João Santana, de 59 anos, é hoje o principal marqueteiro político em atividade no Brasil. Depois da campanha de reeleição de Lula em 2006 (onde criou um brilhante mote no segundo turno, o “Deixa o homem trabalhar”, síntese do sentimento majoritário dos brasileiros naquele momento), feita sob o intenso calor da acirrada disputa política que durara quase dois anos, Santana navegou em águas mais tranquilas (embora não mais fáceis) em 2010, quando teve a tarefa de transferir a grande aprovação de Lula para a neófita candidata Dilma, transformá-la em herdeira de seu legado e, por consequência, sucessora, num cenário político que pedia continuidade. O fez, com enorme sucesso.

Santana é egresso do jornalismo político (foi um repórter destacado à época das denúncias que culminaram na renúncia do Presidente Collor), o que lhe dá sobre as questões da comunicação política um olhar em geral diferente de alguns dos seus colegas, oriundos da publicidade. Faz parte desse olhar diferenciado uma preocupação com os aspectos mais científicos da comunicação política. Ele é um estudioso do assunto. No sábado em que conversamos (10 de março) ele falou com conhecimento e paixão sobre os desenvolvedores das teorias da moderna propaganda política (como Sergei Tchakhotine) e sobre aqueles que as materializaram na prática, muitas vezes intuitivamente (como Napoleão Bonaparte, Simon Bolívar, Getúlio Vargas, Fidel Castro , Hugo Chavez e Lula), para uma silenciosa e atenta plateia de centenas de futuros candidatos. É um marqueteiro peculiar, que pensa a relação entre a história, a política e as campanhas eleitorais.

Além do trabalho que faz para a Presidente Dilma, João Santana está presente atualmente em, segundo ele, “quatro ou cinco países” (Angola, El Salvador, República Dominicana e Venezuela são alguns que conseguimos lembrar). E foi logo após chegar de Angola (“Estou há mais de 24 horas aceso”, disse) e de participar de um seminário sobre as Eleições 2012, que ele conversou com o blog “Campanhas e Mandatos” sobre questões importantes para quem pretende se candidatar a Prefeito ou Vereador este ano e para quem trabalha ou pretende trabalhar no mercado de marketing político brasileiro. Agradecemos a atenção, principalmente porque sabemos o quão raramente ele fala à imprensa. A seguir, os principais destaques da entrevista.

Que conselho você daria para a pessoa que vai se candidatar pela primeira vez?

Primeiro, se tornar conhecido. Segundo, tornar cada vez mais claras as suas propostas. E terceiro, saber enfrentar a conjuntura, examinando se a comunidade quer mudança ou quer continuidade. O equilíbrio entre esses três pontos é fundamental. Não se elege pessoa que não é conhecida; não se elege pessoa que não tem propostas que apaixonem, seduzam. Então, é preciso juntar isso: índice de conhecimento, capacidade criativa de propor e afinidade com o momento que as pessoas vivem no município.

É na TV onde o marketing político brilha. Mas a realidade de 99% dos candidatos é que eles terão de fazer campanha sem TV. Como fazer campanha sem TV?

As campanhas nasceram sem TV. Depois se expandiram através da TV, e a TV é realmente a grande ferramenta. Mas numa cidade pequena tem que se descobrir a forma mais eficiente de atingir o eleitor. A internet hoje, para os municípios que tem uma boa cobertura, é a melhor [coisa] possível. Os meios mais sofisticados também, meios eletrônicos como os smartphones, o celular, apesar das restrições da legislação eleitoral do Brasil, que está defasada neste aspecto. À medida que não haja restrições, se pode usar smartphones, a internet, e se pode usar, antes de tudo, a parte gráfica no dia-a-dia… Quer dizer, com TV se faz muito bem, mas sem TV, também se faz.

Depende do candidato, da criatividade que ele tenha de driblar e descobrir meios de fazer a sua campanha da maneira mais eficiente possível. Porque na verdade, o que a TV faz e os meios de comunicação de massas ajudam, é fazer a campanha que sempre se fez. Antigamente a gente fazia no porta a porta, no corpo a corpo com as pessoas. Os meios de comunicação ampliaram, amplificaram essa capacidade de se atingir as pessoas. Nas cidades pequenas se pode fazer também, até sem nenhum meio eletrônico, e fazer uma campanha eficiente.

[na palestra dada minutos antes, João Santana apresentou sua visão sobre o uso da internet e as redes sociais nas eleições. Ele avalia que a internet é a síntese evolutiva dos meios de comunicação e que, em alguns anos, ela vai mudar a forma de votar, a própria democracia. Que a sua importância cresceu ano a ano e que será muito mais importante nestas eleições que em eleições passadas. Acha que a internet não é a solução para tudo, mas que os candidatos tem que estar nas redes sociais (com Facebook e Twitter). Que não deve ser usada apenas para fazer campanhas negativas (“a internet virou uma lixeira”, disse), mas ser usada de forma criativa].

Você disse há pouco [na palestra] que o político tem que fazer as pessoas sonharem. Você acha que a política está perdendo a capacidade de fazer as pessoas sonharem? O marketing político está pasteurizando a política? O que está acontecendo?

Eu não acho que a culpa é do marketing político, ao contrário. Acho que a culpa, se houver culpa, é da própria política. Houve uma tendência de perda mas no Brasil, nem tanto. Porque o Lula trouxe uma descarga de sonho enorme. A Dilma, à maneira dela, também tem trazido. Tem países vizinhos onde isso acontece muito forte. Mas há uma tendência da busca de “eleitoralismo de resultados”, isso é verdade.

E nesse aspecto, o marketing passou a ser também um elemento inibidor dessa capacidade de provocar sonhos, de provocar esperança… Por que? Quem tem medo de sonhar? É quem tem medo de mudar, e as pessoas muitas vezes se acomodam à busca desse “eleitoralismo de resultados”, pra usar um termo. Isso, na verdade, dominou um pouco. Mas a própria sociedade cobra. Então, cada vez mais, a cada eleição, vão ser cobradas propostas. Mas a culpa não é necessariamente do marketing, acho que é da própria política.

E também a política ainda vive um pouco, no mundo inteiro, um choque de reciclagem, de reposicionamento ideológico, a dita falência do modelo esquerda-direita, a tragédia do socialismo, a sua extração… Mas a gente vai vivendo, e a nossa geração ainda vai acompanhar, eu acho, um momento mundial de ressurreição política muito forte.

Nos anos noventa o marqueteiro era visto como uma espécie de salvador das campanhas. As revistas semanais davam capas aos “gênios da publicidade”. O que mudou nessa profissão dos anos noventa para cá? Qual é hoje o papel do marqueteiro na campanha?

Cada vez mais o sentido da… Não é bem desmistificação, mas do conhecimento pleno dos limites e das potencialidades do que é marketing eleitoral e do papel do consultor político fica claro. Por que? Porque o conhecimento sobre isso é cada vez mais amplo.

É como o futebol, um pouco parecido. A cada dia o futebol não é mais um domínio de alguns brasileiros geniais, é do mundo inteiro. Agora, não se pode subdimensionar, nem superdimensionar o papel do marketing eleitoral, ou da comunicação política, no sentido mais amplo.

Você diria que hoje existe um mercado de marketing político no Brasil? E, tirando as grandes “estrelas” do marketing, é possível alguém viver disso?

Tem, tem e é surpreendentemente um mercado grande, onde está havendo baixa renovação. Porque pela capacidade que o mercado oferece, seja como resultado empresarial, já era para ter muito mais profissionais atuando, mais empresas profissionalizadas.

É surpreendente que a oferta de bons e experientes profissionais esteja muito aquém do que o mercado pode oferecer…

Os Estados Unidos tem uma tradição de “thinks tanks”, instituições voltadas à pesquisa, e de formar gente para pensar essa área. Tem a universidade George Washington, por exemplo…

Isso o Brasil precisa ter. Tem uma carência e as universidades ainda não estão muito atentas pra isso, nem as universidades mais tradicionais, os centros , digamos, mais aprimorados. Houve uma enorme proliferação de universidades privadas e, se você examinar, verá que pouquíssimas, ou quase nenhuma, oferecem curso de comunicação política, de marketing político, eleitoral. É surpreendente isso. Talvez porque não tenham pessoas especializadas para formar, ou falte uma atenção mercadológica a isso. Há mercado, deveria ter muito mais profissionais capacitados para ocupar esse mercado.

Fonte: Campanhas e mandatos

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