Crise orçamentária: deficit da UnB passa de R$ 100 milhões

A situação orçamentária da Universidade de Brasília (UnB) preocupa. As aulas começam hoje e, de acordo com a Reitoria, caso não seja liberada verba extra de custeio, a partir de setembro, a instituição pode entrar em colapso. Faltará dinheiro para arcar com pagamentos de funcionários terceirizados e de estagiários contratados, além de contas de água, de energia e de telefone. Nos últimos 17 anos, o número de estudantes da federal aumentou mais de 122%, expansão que não foi acompanhada por um planejamento orçamentário adequado.

Hoje, o deficit da UnB está em torno de R$ 105 milhões, entre os gastos previstos e a verba repassada. A atual gestão atribui a insufiência ao acréscimo no valor destinado à verba de custeio em 2016 de R$ 80 milhões. O valor, de R$ 219,5 milhões, foi superior ao histórico da universidade e de outras do país. Nos anos anteriores, o orçamento da instituição foi de R$ 102,7 milhões, em 2012; de R$104,8 milhões, em 2013; de R$121,2 milhões, em 2014; e de R$133,8 milhões, em 2015.

Segundo a Reitoria, os gastos de 2016 não consideraram a normalização do orçamento, que passou para R$ 136,7 milhões neste ano. A equipe da reitora, Márcia Abrahão, alega que soube dos valores quando assumiu o cargo e que e os custos são maiores do que os recursos. A gestão passada, de Ivan Camargo, garante, no entanto, que a nova reitora sabia que o valor do repasse voltaria aos patamares anteriores. “O valor de 2016 era atípico. No segundo semestre, estava programado que parte desse orçamento seria destinado a algumas despesas de 2017. Não havia expectativas de que fossem repetir”, diz o decano de Planejamento, Orçamento e Avaliação Intitucional da UnB da gestão passada, Cezar Augusto Tiburcio.

Mesmo com a restrição no orçamento, a promessa da Reitoria é de que as atividades acadêmicas permaneçam inalteradas, pois os recursos para os institutos e para as faculdades não foram reduzidos. “O conselho aprovou o aumento do fundo para atividades específicas do câmpus. Também tomamos a decisão de não impactar a assistência estudantil nem no auxílio dos estudantes”, ressalta Márcia Abrahão.

Para Mauro Mendes, coordenador-geral do Sindicato dos Trabalhadores da Fundação Universidade de Brasília (Sintfub), no entanto, as atividades de ensino, pesquisa e extensão serão impactadas pelo corte de funcionários terceirizados, que já começou. Segundo o sindicato, mais de 300 trabalhadores assinaram o aviso-prévio, que termina no início deste semestre letivo. “Já estávamos com uma equipe insuficiente e, agora, só vai piorar. Para uma educação de qualidade é preciso ter condições. E estamos brigando há anos contra esses cortes, pois sabíamos que isso poderia acontecer”, destaca. De acordo com ele, a redução do efetivo ocorre desde 2015, quando havia 2.720 contratados. Hoje, são 1.880. Com as novas dispensas, o número pode chegar 1.380.

Um terceirizado, que preferiu não se identificar, trabalha na UnB há 16 anos e é um dos funcionários que está com o aviso-prévio assinado. Casado, pai de três filhos, recebeu a notícia com surpresa. “Quando acontece essas coisas, pensamos que não temos valor para a empresa, que todo o tempo trabalhado foi perdido e poderia ter sido investido em outro lugar”, lamenta.

Alguns alunos discordam da forma como a instituição é gerida. É o caso de Gabriel Nagaoka, 20 anos, estudante de direito. Ele e colegas participaram do abaixo-assinado promovido por terceirizados que pedia a gestão democrática do orçamento. “A resposta da reitoria foi evasiva. Alegaram que pensariam em mecanismos para atender a solicitação. Essa situação dos cortes das universidades é um ataque à produção de conhecimento. Lutamos para uma educação gratuita de qualidade”, diz.

“O número de alunos só aumenta a cada semestre, e os professores têm de se virar. Em uma sala de 70 alunos, atualmente, há 100”, desabafa Diego Nascimento, 25, estudante de saúde coletiva do câmpus de Ceilândia. Segundo o também presidente do Centro Acadêmico do curso, os problemas ficarão mais visíveis na volta às aulas. “A segurança já é um pouco falha, visto o tamanho do câmpus. O Restaurante Universitário (RU) anunciou a diminuição da quantidade de alimentos servida. Vemos que há um retrocesso.”

Para Douglas Vasco, 23, aluno de administração no Câmpus Darcy Ribeiro, na Asa Norte, falta assistência aos alunos de baixa renda. “A impressão que dá é que estão deixando tudo de lado.”

Causas

A decana de Planejamento, Orçamento e Avaliação Institucional, Denise Imbroise, afirma que, além do corte dos servidores, outras medidas de contingenciamento são tomadas, como a diminuição dos custos do RU, renegociação da franquia de fornecimento de energia elétrica, racionalização do consumo de água e de despesas com almoxarifado. “É desafiador. Temos trabalhado fortemente buscando a otimização dos nossos recursos e a redução das despesas. Estamos realizando um grande esforço para reduzir todos os contratos e buscamos estender o orçamento mais um pouco”, afirma. Denise também explica que, para utilizar o recurso próprio da universidade — como o proveniente de aluguéis —, é necessário oferecer uma fonte de compensação, o que não é possível no momento.

Uma recomposição orçamentária também foi solicitada ao MEC, mas a pasta informou que ainda não é possível disponibilizar o recurso. Em contingenciamento, o ministério teve parte do empenho bloqueado por tempo indeterminado. Essa restrição pode ser revista ou não durante o ano, a depender da situação fiscal. Ao todo, o corte imposto pelo governo federal à área chegou a R$ 4,3 bilhões. Em nota, o MEC destacou que as universidades têm autonomia administrativa e de gestão financeira e patrimonial para realizarem a aplicação de recursos. “Após efetuar a liberação financeira, o ministério não tem qualquer ingerência sobre os processos de pagamento que estejam a cargo de suas unidades vinculadas”, ressaltou. Acrescentou ainda que, mesmo considerando a fonte do Tesouro, em 2016, liberou 100% do limite de empenho para as despesas de custeio da UnB.

O economista especialista em finanças públicas Roberto Piscitelli acredita que, apesar de importante, a expansão da universidade foi ambiciosa. “Ao se expandir, as necessidades de manutenção se multiplicam. E nós tivemos, nos últimos anos, uma deterioração nas finanças públicas. É preciso de algo pensado e bem projetado. A universidade é o maior centro de pesquisa do país”, afirma.

Fonte: Correio Braziliense

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