A pessoa como base, matéria-prima e limite da imagem – II

imagem-publicaMesmo a realidade precisa ser trazida à luz, harmonicamente, com os outros componentes da imagem, para que, sob a forma de percepção, venha a ser conhecida.

Com frequência, os publicitários se baseiam no errôneo pressuposto de que sempre é possível construir a imagem desejada do político a partir do “zero” ou “na prancheta”. Depois disso é só “vendê-la” ao eleitor, por meio de uma publicidade criativa. Tais estratégias colidem frontalmente com a realidade.

A questão entre “ser e parecer” foi explicada em uma clássica frase do imperador Júlio César

Nem o candidato consegue ser tão persuasivo negando sua própria realidade íntima, nem o eleitor é tão ingênuo para não perceber a mistificação que lhe é oferecida como realidade. Entre um e outro limite, encontra-se o espaço legítimo, realista e eficiente de construção e administração da imagem desejada.

Imagem e personalidade: ser e parecer ser

Os trabalhos de construção de imagem encontram-se, inevitavelmente, balizados e pré-limitados pela personalidade. Forçar uma imagem desejada, contra traços de personalidade fortemente estabelecidos e profundamente enraizados é um desastre político certo.

A tradição política está recheada de aforismos sobre a relação existente entre “ser e parecer” – a problemática central da questão da imagem – que se tornaram célebres. Assim, Baltasar Gracián advertia no seu aforismo 130:

“Seja, mas também pareça ser. As coisas não passam pelo que são, mas pelo que parecem ser.”

De Júlio César, é clássica a frase que teria pronunciado sobre sua esposa:

“A esposa de César, não basta que seja honesta. Deve também parecer honesta”.

Na vida social e política, as pessoas conhecem e são conhecidas por suas respectivas imagens. Nelas os contatos são episódicos, distantes, rápidos, superficiais, interessados, inviabilizando a possibilidade de um relacionamento pessoa a pessoa mais pleno, mediante o qual um conhecimento pessoal seria construído. Somente é possível lidar com um grande número de pessoas, quando o conteúdo do relacionamento é superficial, o convívio é breve e episódico, e os vínculos são baseados mais no interesse que na afeição.

Por estas razões (que decorrem da estrutura da situação, mais que da vontade das pessoas), no mundo da política, seus protagonistas apresentam-se ostentando suas imagens, e não sua personalidade total.

Um candidato dirige-se à imagem que possui dos eleitores que se propõe a conquistar, assim como os eleitores votam na imagem que adquiriram dos candidatos em disputa. Nenhum chega a conhecer a personalidade real do outro. Não é nem possível, nem necessário. Esse é mais um exemplo de um princípio fundamental da política, muitas vezes esquecido:

“Na política não só a percepção é diferente da realidade, como a percepção é a realidade”.

Se o jogo político ocorre entre pessoas vestidas com suas respectivas imagens, as relações estabelecem-se com base nas percepções que se adquirem mutuamente, muito mais que no substrato pessoal de cada indivíduo. Alianças, apoios, conflitos, competição etc ocorrem entre pessoas que “representam papéis”. Por isso há o primado da percepção sobre a realidade.

Uma imagem construída a partir do zero não vai se sustentar, não cola

A realidade de cada um, só possui valor político, quando integra a imagem com a qual o político se apresenta para o jogo. Ou quando a implode, por seu súbito aparecimento, em aberto conflito com ela.

Em outras palavras, quando está facilmente ao alcance da percepção dos outros. Isto equivale a dizer que, mesmo a realidade, precisa ser trazida para a luz, harmonicamente com os outros componentes da imagem, para que, sob a forma de percepção, venha a ser conhecida.

Analogamente, relações estabelecidas com base nas respectivas imagens, empurram a política para o mundo da representação. É como se os atores que representaram Tartufo, Otelo, o doente imaginário, Édipo, Roxane, Macbeth, Julieta etc, não despissem seus trajes após o espetáculo, nem mudassem sua maneira de falar e movimentar-se, e continuassem, na vida real, a agir e comportar-se de acordo com seus papéis naquelas peças teatrais.

Também por estas razões, a política possui uma inegável dimensão de espetáculo. O desenvolvimento e aperfeiçoamento dos meios de comunicação social – as mídias – sua penetração universal na sociedade, sua força comunicativa, sua atualidade e instantaneidade, deu origem a esta realidade tão presente nas vidas de eleitores e políticos: a política como espetáculo.

Fonte: Política para Políticos

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