Poder e influência são dois conceitos centrais da ciência política. Enquanto o primeiro apoia-se sobre a coerção constitucional, o segundo depende da vontade individual para expandir sua potencialidade.
“Poder é a produção de efeitos desejados”
(Bertrand Russell)
Nenhum conceito é mais usado na linguagem da política que o de poder. Falar em política é falar em poder. Entretanto, trata-se também de um conceito da vida diária que se aplica em muitos outros aspectos completamente distintos da política. Além disso, poder é um conceito muito próximo de outros termos, particularmente de influência. O que é então, verdadeiramente, o poder na política? Em que consiste? Qual sua função na vida social? O que o distingue de termos similares, como influência? Por que as sociedades organizam-se com base no poder e não em outros princípios?
Praça dos Três Poderes, centro do poder político nacional
O poder pode ser visto como uma massa de energia que a sociedade coloca nas mãos do governante, dentro de marcos legais estabelecidos, para realizar os objetivos dos seus membros. Ela é composta por recursos financeiros, ativos instalados e em operação (usinas, estradas, redes de energia etc) e, também, pessoal contratado para operar as instalações públicas e fazer a máquina do governo funcionar, em todas as suas frentes. Quem comanda esta massa de energia detém o poder, assumindo a responsabilidade pela administração pública – provendo bens e serviços comuns para a população – e pelas suas realizações – tudo o que é feito além do que já existia. Esse é o poder político em qualquer nível – uma cidade, um estado, um país. Luta-se pelo poder exatamente para adquirir o comando da massa de energia com a qual torna-se possível realizar objetivos de natureza coletiva.
Por sua própria natureza, o poder não convida, manda; não sugere, determina. O poder se ampara, em última análise, no uso legítimo da força para fazer valer as leis e a ordem pública. Há toda uma estrutura legal que legitima o uso ou a ameaça do uso da sanção física para garantir que as decisões do poder – obtidas em respeito à Constituição – sejam cumpridas e obedecidas pelos cidadãos. Portanto, o poder é uma energia muito eficiente para realizar tarefas e para afetar o comportamento das pessoas. Enquanto a influência para induzir determinado comportamento dependerá sempre da aceitação do influenciado, da sua anuência, o poder induz o comportamento desejado, independentemente da anuência, aceitação, boa ou má vontade do indivíduo afetado. A influência é sugestiva, o poder é autoritário, embora, numa democracia, ele expresse o exercício da autoridade legítima, sempre dentro dos limites estabelecidos constitucionalmente.
Por que as sociedades se organizam com base no poder e não na influência?
Porque a provisão de bens e serviços públicos, da qual depende a própria sobrevivência da sociedade, exige que o governo tenha capacidade de ação e meios a sua disposição para executá-la, mesmo contrariando interesses da população. Ninguém gosta de pagar impostos e, se o pagamento fosse voluntário, não haveria como financiar o governo. Ninguém gosta de ir para a guerra e se esta decisão fosse voluntária, não se poderia organizar as forças armadas para a defesa nacional. Da mesma forma, todos gostariam de dirigir seus carros como bem entendem. Mas se isto ocorresse, o trânsito se tornaria um caos e o risco de andar nas ruas seria proibitivo.
Ninguém gosta de ir para guerra
Os exemplos podem ser multiplicados, mas em todos os casos nos defrontaremos com a realidade de que, se a vida social tivesse a sua base fundada na influência, na persuasão, jamais haveria a certeza de que os bens públicos (saúde, educação, segurança, limpeza, transporte, investimentos etc) seriam providos à população. Somente fundando-se a vida social no poder pode-se ter segurança de que os serviços e bens públicos serão providos aos indivíduos – e estes terão que adaptar seu comportamento às regras legalmente vigentes. O poder é simplificador, é um atalho. Como ele se exterioriza por comandos garantidos por sanções, a probabilidade de que tais comandos venham a ser observados e cumpridos é muito alta.
Essa é a razão por que os grupos sociais se organizam politicamente para conquistar o poder. Quem o conquista ganha o governo e, com ele, o poder. Em outras palavras, ganha o direito legítimo de usar aquela massa de energia para realizar os objetivos aos quais foi escolhido. O competente exercício do poder, então, não é apenas um atributo ou qualificativo de uma liderança. Muito mais que isto, ele é um imperativo da sobrevivência da sociedade, do seu ordeiro regramento e da vida civilizada.
Poder e influência
Poder e influência são conceitos tão próximos que é comum serem usados como sinônimos. Na realidade, é fundamental para a análise política distinguí-los, porque se referem, respectivamente, a situações muito diferentes. O conceito de influência é, na verdade, mais amplo que o conceito de poder, sendo este um dos tipos que a influência pode assumir. Uma definição prática de influência seria assim:
“A” influencia “B” na medida em que consegue que “B” faça algo que não faria, se não houvesse sofrido a ação de influência.
Para que haja o exercício da influência, portanto, é preciso que haja:
uma ação de influência de “A” sobre “B” – indução, persuasão, sugestão etc
que resulte em “B” fazendo algo que por iniciativa própria não faria
algo esse que foi induzido, sugerido, solicitado por “A”
Assim, não se pode falar em influência quando “B” faz algo por própria iniciativa – ou faria de qualquer maneira por vontade própria – aquilo que “A” deseja que ele faça. Do mesmo modo, não há influência quando “A” exerce a influência e “B” não faz o que lhe foi instado. O que distingue influência de poder é o fato de que, no caso da influência, o indivíduo é livre para aceitá-la ou não, para aquiescer à ela ou recusar-se, sem sofrer as conseqüências da recusa. Já no caso do poder, esta liberdade não existe. Ou o indivíduo submete-se à determinação – e faz o que de outra forma não faria – ou será penalizado pela recusa. A influência funciona pela persuasão, pela sugestão, pela indução, pelo convencimento. O poder funciona pelo comando, pela ordem. Na influência não há penalização cominada à não observância. No caso do poder, há sempre o uso ou ameaça do uso da coerção física para garantir a anuência do comportamento com a ordem.
Nada se equipara à influência dos pais sobre os seus filhos
Mesmo quando o poder usa argumentos de persuasão, estes não passam de meros coadjuvantes, já que perdura de forma íntegra a possibilidade de recorrer à sanção física para garantir a anuência do comportamento em relação à regra. É, portanto, fundamental ter-se em mente essa diferença básica para analisar o processo político e evitar os erros teóricos e práticos que decorrem de sua confusão. A influência, entretanto, possui gradações. As pessoas podem ser comparadas de acordo com o grau de influência que possuem. É essa variação no grau de influência que mais interessa na análise política. Como se pode medir, então, o grau de influência das pessoas?
Pela quantidade de mudança provocada na posição do ator influenciado. Quanto maior for a mudança que “A” provoca em “B” por meio de sua persuasão, maior será a sua influência. Assim, por exemplo, uma pessoa que consegue que outros não apenas votem no seu candidato, mas também trabalhem por sua candidatura e contribuam com recursos para a campanha, será mais influente que outra pessoa que consegue apenas que os influenciados se limitem a votar no seu candidato.
Pelo custo subjetivo e psicológico da anuência. Uma pessoa que consegue que outro faça algo que lhe é muito custoso, psicologicamente doloroso, economicamente danoso, por exemplo, é mais influente do que outra que consegue a anuência para a prática de ações de baixo custo pessoal. Por exemplo: conseguir que alguém que dependa do salário mensal para viver adira a uma greve é muito mais custoso do que conseguir atrair para a greve alguém que possui recursos com os quais se sustentar. Quanto mais sucesso obtiver alguém em conseguir que outros façam sacrifícios pessoais para seguir a sua orientação, maior sua influência. Líderes políticos são pessoas que conseguem extrair dos seus liderados – por sua persuasão, confiabilidade, pela admiração e carisma – sacrifícios pessoais para a realização de objetivos por ele fixados.
Pelas diferenças no espectro das reações desejadas. Uma pessoa pode ser influente em apenas uma dimensão. Fora dela, sua influência é nula. Assim, quanto mais amplo for o espectro das áreas em que a influência se exerce, maior ela será. Essa é a razão pela qual nada se equipara à influência dos pais sobre os filhos. O espectro dessa influência é muito amplo, cobrindo todas áreas sobretudo quando os filhos são crianças. Com a idade, a influência dos pais diminui e aquele espectro reduz-se a certas áreas. A partir de então, o jovem e o adulto vão escolher livremente suas influências consentidas.
Pelo número de pessoas que aceita a influência. É óbvio que quanto maior for o número de pessoas que aceita a persuasão, sugestão, convencimento de alguém, maior será o seu grau de influência. Há pessoas que podem ter influência sobre alguns, como há pessoas que conseguem influenciar multidões.
Todas medidas para avaliar o grau de influência devem ser usadas em conjunto. Nenhuma delas, isoladamente, será satisfatória para todas as situações. De qualquer forma, encontra-se o máximo de influência em quem consegue “escores” altos em todas medidas.
Fonte: Política para Políticos